21 de Março é Dia Internacional da Síndrome de Down, e precisamos falar sobre esta condição genética, racismo e invisibilidade

No Brasil, de 2019 a 2021 foram detectados o nascimento de 1.978 pessoas com Síndrome de Down, correspondendo a uma prevalência de 4,6 por 10 mil nascidos, de acordo com dados do governo federal. A Síndrome de Down não é uma doença, mas uma condição genética que causa modificações no cromossomo 21 das células, podendo aumentar a incidência de algumas patologias. Nesse caso, é importante que a população com SD tenha acesso de qualidade a atendimentos multiprofissionais na Saúde, o que ainda é uma realidade desigual para pessoas negras que, além do capacitismo, também sofrem com o racismo. 

O 21 de março é reconhecido como Dia Internacional da Síndrome de Down pela Organização das Nações Unidas (ONU) desde 2011. A data escolhida (21/03) faz referência à presença de três cromossomos 21 nas células, ao invés de apenas dois, sendo conhecido também como Trissomia do cromossomo 21. No Brasil, a data entrou no calendário nacional anos depois, em 2022, a partir do Projeto de Lei (PL) do ex-senador Lindbergh Faria. 

A data também marca o Dia Internacional da Luta Contra a Discriminação Racial, que reforça a reflexão sobre as diversas violências que atravessam a vida de pessoas negras, oportunidade de também lançar luzes sobre as nuances do racismo na vida de pessoas com Síndrome de Down, que, além da questão racial, também são vítimas do capacitismo. De acordo com informações do relatório “Diretrizes de atenção à pessoa com Síndrome de Down” (2013), é necessário que elas sejam acompanhadas pelas “políticas públicas do Ministério da Saúde”, no entanto, as desigualdades sociais que levam pessoas negras a condições de vulnerabilidade impedem que tenham acessos dignos que garantam qualidade de vida.

“Nós enxergamos o impacto do racismo de maneira ampla. Não falamos apenas de pessoas negras com SD, falamos também dos mais vulneráveis, mas são elas em sua maioria pessoas negras”, é o que explica Alyne Gonçalves, uma das fundadoras do Instituto InvisibiliDOWN. Mãe de Izadora, uma criança negra de três anos com Síndrome de Down, Alyne diz que o racismo geográfico incide de forma considerável no cotidiano de pessoas com SD. “Quem são as maiorias nas comunidades? Quem são invisibilizadas? Pessoas negras. Então existe também um racismo geográfico. São pessoas que estão nesses lugares e que não têm acesso sequer a um pediatra”, completa. 

Aline e a pequena Iza | Arquivo pessoal

Segundo a cartilha divulgada pelo Ministério da Saúde,  houve um aumento considerável na expectativa de vida das pessoas com SD a partir da segunda metade do século XX, o que não tem se aplicado efetivamente no grupo populacional negro. Informações do Instituto InvisibiliDOWN mostram que a expectativa de vida de pessoas negras com Síndrome de Down é de 25 anos, enquanto pessoas brancas com a mesma condição chegam a viver 60 anos. Para Alyne, a falta de acesso à educação, moradia e saúde são realidades que ampliam essa situação. “Mais de 50% das pessoas com Síndrome de Down nascem cardiopatas. Aqui na minha cidade,  Carapicuíba (São Paulo), não tem cardiologista. Existem casos de crianças com SD que vieram a óbito antes de conseguirem uma vaga de cirurgia cardíaca”, relata.

As dificuldades impostas pelo racismo e capacitismo também são sentidas por Amanda Pereira, 34 anos, mãe de Maya, uma criança de 10 meses com Síndrome de Down. Amanda, que reside na cidade de Macaíba, no Rio Grande do Norte (RN), conta que, além das violências corriqueiras que mulheres negras sofrem no parto, sua filha foi vítima de “desleixo médico” ao não receber a confirmação do diagnóstico de sopro no coração. “Durante a gestação fiz um exame que mostrou que Maya tinha um sopro no coração. A pediatra que acompanhou ela fez um exame clínico e disse que minha filha não tinha mais  o sopro”, relata Amanda que três meses depois em uma consulta com outro médico especialista em SD, em um Hospital Universitário, foi identificado que Maya era cardiopata. “Poderia ser um erro médico qualquer se a Síndrome de Down não viesse condicionada com malformações, inclusive cardiopatias genéticas. Houve um desleixo no cuidado com minha filha”.

Invisibilidade

Outro fator que impacta negativamente na vida de pessoas negras com Síndrome de Down é a invisibilidade que nega a existência dessas pessoas, experiência que Maya e Amanda vivenciam de perto. “Primeiro que existe uma lógica, que não é provada cientificamente, de que pessoas negras não têm SD, e com isso reforça a invisibilidade e muitas vezes essas crianças morrem no processo”, alerta Amanda, que também narra essas circunstâncias vivenciadas no Rio Grande do Norte, onde fez o seu pré-natal de risco em um local de referência nacional nos casos de neurodesenvolvimento, o Centro de Saúde Anita Garibaldi.

Amanda e sua filha Maya | Arquivo pessoal

“Eu concordo que existe a invisibilidade e com Maya isso é muito gritante. Os médicos olham com cara de surpresa. Como é que no Rio Grande do Norte eu só conheço Maya enquanto uma criança negra com SD?” questiona Amanda. “O único geneticista que tem aqui no estado desconhece outras crianças negras com Síndrome de Down no Rio Grande do Norte e eu sei que esse não é um dado real, mas que tem a ver com a invisibilidade”. 

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